Boniteza:
\O por do sol
do Morro do Cruzeiro
abraçando a minha cidade
A lua cheia beijando
a lagoa Mundaú
O amanhecer
na Chapada do Guimarães
Um Karajá
singrando sua canoa no Araguaia
O mar de Pajuçara
A serra da Barriga! A Serra da Barriga!
Por aqui passaram todos
ou quase todos
os meninos do meu tempo.
O prédio um tanto quanto gasto,
desbotado,de quando em vez o governo
mandava pintar.
LIÇÕES DE COR
A-Entrada matinal
uma briga era sagrada
por motivo algum,ganhava quem dava:
o primeiro chute
o primeiro cuspe
o primeiro tapa.
B-O Sino
o seu melhor toque
era o do recreio.
C-Viagem
Minha primeira viagem pelas Américas:
mar afora sonho adentro.
Aulas de História
D-tabuada
Ás sextas-feiras
a guerra dos sexos.
A professora:
-Cícero, 9 X 7?
-Ihhh!
-66
A vitória dependia de mim.
Entrava na sala sisudo como uma enciclopédia. Suas aulas
como num filme, iam
do ìmpério romano
ao otomano
num pulo só.
Eu aluno aplicado
Nada perdia
Daqueles feitos
Aqueles fatos.
Nomes e medos se espalhavam no quadro negro:
Átila
Genghis Khan
Nero
Calígula, César
Até tu Brutos!
Hitler era a própria besta.
O giz em sua mão
e lá vinha a saga de Cabral.
...para seu governo essa terra tinha dono:
Caetés
Tupinambás
Potiguaras
Pataxó
Xocó
Kaiapó
Kamaiurá
Kaingang
Tapirapé
tanta gente Tupi
filhos de Tupana
Topê
Mavutisinin
Maira-Monã
Namatuyky
A Voz de Cicero Vieira e o silencio na sala
atravessavam os séculos
no Ginásio Nossa Senhora Das Graças
Os portugueses levaram tudo
ou quase tudo:
da Ypirabitanga, as Esmeraldas ao Ouro de Minas.
Do tronco, da chibata e da dor,bradou o professor,
nasceu nesse chão a semente de ser livre
Acotirene
Ganga Zumba
Aqualtune dos Jagas
Dandara
Zumbi
Palmares
Cerca Real do Macaco
Serra da Barriga
Bem minha gente!
Amanhã eu vou falar da revolta dos Malês
e do Boca do inferno...
A Pietá em frente a Matriz de Nossa Senhora das Dores
está alí exposto ao sol,
Jesus é um poeta morto
nos braços da sua mãe.
Diante a expressão crua
da mãe que chora o filho morto
na dor nos braços tomados
-- uma romeira sertaneja
lamentou o triste fado.
Tadinho!
disse numa voz sofrida,
padre Murilo estava ao lado.
O rosto da romeira alagoana
em lágrimas banhado,
o padre então se aproxima
e pergunta com cuidado:
a devota teve dó
de Jesus naquele estado?
pois bem sei que tadinho
é o mesmo que coitado
a senhora enxuga as lágrimas
olha o padre em demorado.
Seu vigário, foi assim que recebi
do jeito da Mãe de Deus
o meu filho apunhalado.
para Murilo de Sá Barreto
te amei de longe
meus olhos miravam tua distância.
Amei teu corpo longo, escultural.
Meus pés caminhavam ao teu encontro.
Tomado da emoção primeira
quis tomar-te em meus braços
mas eras demasiada grande
tão longa que minhas mãos
jamais poderiam tocar-te em todo.
Amei
o verde-azul predominando tuas escarpas.
Te amei de longe...de muito longe,
morada de Deus,
Chapada do Araripe.
alquebrado pelo alforge dos anos,
os olhos de quase cego
no quarto repleto de armas
assombrado de almas.
Na boca do velho proscrito
desfile de nomes:
meia noite
arvoredo
juriti
deus te guie
sabiá
Magote de cangaceiros.
Suas histórias
De escaramuças com os macacos
era de arregalar os olhos
do menino assustado de encanto.
a pele marcada
de lembranças
mandacarus, coroas de frade
e macambiras.
sertão de sol a pino.
amigo do meu pai
o cangaceiro Joventino
Caruaru
estádio do Central
bingo do Cobrinha
repleto de alagoanos,
num sábado quente
de verão
meu pai
marcava uma cartela
de um fusca prometido
era o carrro dos seus sonhos.
faltando apenas um número.
De repente:
soltam uma cobra
no meio da multidão
gritos...labafero... correria
foi aquele cu de boi.
a policia fecha o bingo,
o sonho do carro foi embora
e a carteira do meu pai.
tiramos a pé
para feira, tristeza ,
silencio de fim do mundo.
Fomos salvos
por Antonio Gomes
que nos deu
comida, carona,
E a primeira cerveja
Que bebi na minha vida
Às vezes deixava a mesa
e ia comer no chão
de cócoras, (olhos de índia).
Na ira
sua voz tremia todos
os objetos do dia.
Aos vizinhos
Cicera Solidária.
A catarata aumentou
sua solidão e os resmungos.
Assim se foi,
Tão longe da luz
Tão dentro de si.
Minha mãe
Çe Mãya
Mãyakuéra
Campo do seu Caubi
o campo de terra
mais inusitado da terra
as filas de coqueiros em campo
eram mais duras que os adversários.
quisera fosse só os coqueiros
a nos advertir da pejeja do jogo,
naquele espaço-tempo havia
as manga...as mangas e seu perfume.
a bola dente de leite
nosso azougue de felicidade
teimava em não terminar o dia.
na hora da briga
Dona Audinete da varanda
gritava altiva:
--- fim do jogo!
A Fuga Da Leoa
Certa feita num quando passado
Chegou um circo em Murici,
Estava mais para um zoológico.
Quando num descuido perto da jaula
Um tigre esfomeado
Quase arrancou os dedos,
Do Seu Antônio Rato.
Ufa! pares de susto.
Mas o pior estava por vir:
No meio do racha
Uma leoa saiu da jaula
No descuido do tratador,
Correu pro meio do campo.
Sebo nas canelas
Correrias de pavor da meninada.
Fomos salvos pela jumenta, do Seu Sérgio,
Que pagou com a vida.
À noite,
Mané Izique
Salvou a nossa honra,
Com coragem para mamar em onça
Entrou na jaula do leão
A plateia delirou,
a cidade parou para ver.
Aritana
meu canto é para Aritana
Agütaná dos Yawalapiti
nascido ás margens do Tywatywaturi
num tempo que Kamaiurá pelejava com Suyá
Aritana, filho de Kanato
e Tipori dos Kamaiurá
Aritana
senhor supremo do huka huka
o chão nunca lhe viu derrota
Amulaw do seu povo
olhos do Xingu
como Pirakumã
este canto é para o grande líder
senhor de todos os saberes
as vozes dos peixes
dos bichos
todos os encantos das matas.
Aritana
Da Aldeia dos Tucuns
Caiu para a covid
todos os povos do Xingú
sabe o porque
